MP sedia painel sobre internação compulsória por uso de crack
Com lotação máxima, o auditório do Palácio do Ministério Público foi palco na noite desta quinta-feira, 1º, do painel “Crack: internação compulsória resolve?”, organizado pelo Instituto Crack nem Pensar, que tem como apoiadores o MP, o Governo do Estado, a Assembleia Legislativa e a Secretaria da Justiça e dos Direitos Humanos. Os debatedores do encontro foram o sociólogo, especialista em segurança pública e autor do livro que inspirou o filme Tropa de Elite, Rodrigo Pimentel; o secretário da Justiça e dos Direitos Humanos, Fabiano Pereira; o deputado federal e autor do projeto de lei que prevê a internação involuntária de dependentes, Osmar Terra; e o presidente da Central Única de Favelas no RS, Manoel Soares. O ouvidor-geral do MP, Luiz Cláudio Varela Coelho, representou a Instituição no evento, que também contou com a participação de Promotores, Deputados e autoridades na área.
Na abertura dos trabalhos, o presidente do Instituto Crack nem Pensar e subprocurador-geral de Justiça para Assuntos Institucionais, Marcelo Dornelles, falou sobre a caminhada da entidade na prevenção à drogadição. “Esse problema tem repercussão direta no trabalho de Promotores de Justiça. Em cada local que visitamos pelo instituto foi possível verificar que as demandas de violência estavam ligadas ao crack”, destacou. Ele também explicou que o objetivo de encontros como esse é fomentar o debate e a troca de experiências entre todos os envolvidos com o combate ao uso de drogas. “Em relação à internação compulsória, queremos saber o que está sendo feito no RS e conhecer o trabalho de outros estados brasileiros”, frisou.
EXPERIÊNCIA DO RJ
Primeiro palestrante da noite, Rodrigo Pimentel iniciou sua abordagem falando do aumento da violência, apesar da grande ascensão social e da queda do desemprego no Brasil. “E o que percebemos é que o crack virou a principal justificativa da violência no país”, disse. Segundo ele, no trabalho como comentarista da Rede Globo, foi possível perceber o grande número de cracolândias se espalhando pelas favelas cariocas. “O mais curioso é que autoridades de segurança, saúde e assistência social não assumiam a responsabilidade pelo problema. Decidimos entrar pesado nessa discussão, até que o Governo do RJ determinou a intervenção desses centros de venda de droga”, explicou. Conforme Rodrigo Pimentel, logo após essa medida já foi possível perceber a queda de homicídios e furtos nessas regiões.
Em relação aos usuários, segundo Pimentel, atualmente são três mil os internados para desintoxicação da droga no Rio de Janeiro, 600 deles de maneira compulsória. O especialista em segurança pública disse ser favorável à medida, desde que bem estruturada. “Na minha trajetória como policial, aprendi que o crack era um caminho sem volta. Mas como jornalista descobri que há saída sim. E eu tenho medo de vender essa história como um caminho sem volta, pois isso justifica a ausência de políticas públicas”. Rodrigo Pimentel falou, ainda, sobre as experiências das Unidades de Polícia Pacificadora no RJ. “Onde há UPP não tem cracolândia e estamos preservando milhares de jovens. No Complexo do Alemão, com um ano de ocupação, foram registrados apenas dois homicídios, um assassinato e um passional. Isso demonstra que resolvemos também um problema de segurança pública”.
TRABALHO NO RS
Na sequência, o Secretário da Justiça e dos Direitos Humanos do RS falou sobre o que vem sendo feito no Estado para combater o crack. De acordo com Fabiano Pereira, a primeira medida que o Governo adotou ao assumir foi a criação de um Sistema Estadual de Políticas sobre Drogas. Ele também citou medidas como a assinatura de um termo de cooperação com diversas instituições, entre elas o Ministério Público, que serviu para descapitalizar o crime e passar para o Estado a responsabilidade sobre bens oriundos do tráfico de drogas. “A partir de agora vamos evoluir para a definição de uma estratégia para enfrentar o problema, que passa pela mobilização social e pelo olhar atento para os pequenos municípios gaúchos, onde a droga também se instalou”.
Fabiano Pereira também destacou a necessidade da disputa de oportunidades, através de projetos realmente emancipadores e que ofereçam direitos a todos e sobre programas em desenvolvimento para o acréscimo de leitos hospitalares para o tratamento de usuários. “Mas além de tudo isso, temos que acreditar que existe saída e a cura para os dependentes”, defendeu.
PROJETO DE LEI
Autor do projeto de lei 7663/2010, que prevê a internação involuntária de dependentes, solicitada pela família e decidida pelo médico, o deputado federal Osmar Terra destacou que o PL prevê a classificação de drogas e o aumento de penas para traficantes, introduz a baixa compulsória de dependentes, estabelece uma rede de atendimento com organizações governamentais e não-governamentais e cria incentivos para reinserção social.
Osmar Terra, que durante oito anos foi Secretário Estadual da Saúde, explicou aos participantes o processo de dependência e as alterações no cérebro dos usuários de drogas. “Tenho convicção absoluta que se o usuário voltar para um ambiente que sugerir droga, vai sentir a fissura de novo”, alertou. Apesar da falta de uma pesquisa mais fidedigna, o deputado estima que 1% da população gaúcha seja usuária de crack.
REALIDADE NAS COMUNIDADES
Último painelista, o presidente da Cufa/RS, Manoel Soares, que substituiu no evento o presidente nacional da Central Única de Favelas, Preto Zezé, ausente por problemas de saúde, falou sobre a realidade na periferia gaúcha. “A verdade é que até a solução chegar na ponta, os traficantes se estruturam de maneira diferente para continuar atuando”, revelou. Ele também demonstrou preocupação com a falta de tratamento para os dependentes. “Usuários de crack só resistem por um bom tempo quando tem condições de, em estado crítico, receber algum tipo de tratamento. Os demais acabam morrendo no primeiro ano de uso”.
Em relação à internação compulsória, Manoel Soares frisou que é importante primeiro definir quais os problemas a ser resolvidos. “Se a intenção é ressocializar não resolve. Me provem que a internação compulsória tem condições dignas de recuperar as pessoas que eu sou a favor dela”, provocou.
AVALIAÇÃO FINAL
Ao término do encontro, o presidente do Instituto Crack nem Pensar, Marcelo Dornelles, saudou o grande interesse da sociedade no debate do tema e o alto nível dos debates. “O que pensamos aconteceu: se colocaram posições divergentes para suscitar reflexões sobre o tema. Acredito que todos saímos melhores”, avaliou.