Operação Gota D’Água interdita empresa, afasta titular da 16ª CRS e prende três por venda de água contaminada
Durante a deflagração da Operação Gota D’Água, nesta quinta-feira, 23, foram presos preventivamente Ademir Paulo Ferri e Paulo Moacir Vivian, sócios da empresa Mineração Campo Branco Ltda., bem como o seu funcionário, o químico industrial Marcelo Colling. Além disso, foi afastado, por determinação judicial, o 16º Coordenador Regional da Saúde, Vitor Hugo Gerhardt. A justificativa para as prisões é que houve dolo na venda da água, já que tinham pleno conhecimento, através de laudos encomendados pela própria empresa, da contaminação do produto por bactérias. Já o afastamento é justificado porque houve, conforme as investigações, prevaricação: o Coordenador da 16ª CRS deixou de interditar a empresa, mesmo após sugestão de seu subordinado, e diminuiu a multa imposta de R$ 20 mil para R$ 2 mil.
Os mandados foram cumpridos em Progresso, Lajeado, Porto Alegre e no estado de Pernambuco. As investigações são realizadas pelo Grupo de Atuação de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) Segurança Alimentar, em conjunto com as Promotorias de Justiça Especializada Criminal, de Defesa do Consumidor e de Combate aos Crimes contra a Ordem Tributária. Participaram da Operação os Promotores Mauro Rockenbach (Criminal) e Alcindo Luz Bastos da Silva Filho (Defesa do Consumidor).
Também foi interditada a sede da empresa, em Progresso. A Fepam constatou que a área tinha o dobro de metragem do informado e, portanto, o licenciamento do envase era de responsabilidade da autarquia estadual. A empresa havia informado que teria 2 mil m² de área de envase (portanto, seria de atribuição do Município o licenciamento), mas, na realidade, tem o dobro de tamanho. A Fepam também lacrou os dois poços de extração de água mineral por péssimas condições de higiene, o que provoca a contaminação. Um dos poços não era de conhecimento das autoridades públicas. A Licença de Operação da Fepam estava vencida desde abril de 2013.
A empresa envasa para as marcas Do Campo, Carrefour, Biri Biri e Roda D’Água. O MP acionou o Centro Estadual de Vigilância em Saúde (Cevs) para que sejam emitidas circulares a todas as vigilâncias sanitárias do Estado para que retirem os lotes 410, 421, 028 e 272 do mercado. O Cevs lavrou auto de infração pela produção e comércio de produtos impróprios ao consumo.
ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA
O MP entende que os investigados se associaram, de forma ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas com o objetivo de obter vantagens, para praticar os crimes previstos no artigo 272, §1º-A do Código Penal (adulteração de bebidas, com pena de quatro a oito anos de prisão). A Justiça determinou, por solicitação do MP, a proibição de acesso à sede e à filial da empresa a outros cinco suspeitos.
ENTREVISTA COLETIVA
O Promotor de Justiça Mauro Rockenbach explicou, durante entrevista coletiva à Imprensa na Promotoria de Justiça de Lajeado, que a conduta de Vitor Hugo Gerhardt foi muito importante para que a fraude ocorresse. “Ele estava acobertando a atividade ilícita da mineradora, por ligações políticas; ele foi indicado pelos sócios da fonte para que ocupasse o cargo de Coordenador; ele responderá por prevaricação”, adiantou.
Por sua vez, o Promotor de Justiça Alcindo Luz Bastos da Silva Filho orientou que as pessoas que tiverem água dos lotes já comprovados procurem os locais onde realizaram a compra, com nota fiscal, para a troca da mercadoria ou a devolução do dinheiro. Também participou da coletiva o Promotor de Justiça de Lajeado Éderson Luciano Maia Vieira.
O Delegado Adjunto da Receita Estadual de Lajeado, Fábio Ricardo Koefender, informou que a empresa sonegou, comprovadamente, R$ 3,2 milhões em tributos estaduais. Com a vistoria realizada durante a Operação, a Receita acredita que mais subfaturamentos e não inclusão de notas fiscais nos lançamentos devam ser verificadas.
PSEUDONOMAS AERUGINOSA E COLIFORMES
Conforme o apurado, os três presos fazem parte de um grupo criminoso que orquestrou a venda de água mineral com presença acima do permitido da bactéria Pseudomonas aeruginosa, coliformes totais, limo e mofo, além de partículas de sujeira. As irregularidades foram comprovadas por diversos laudos da própria empresa obtidos pelo MP (os lotes 410 de 02/02/15 e 421 de 20/04/15, de bombonas de 20 litros, deram origem a uma autuação pela Prefeitura de Progresso pela presença de bactérias). Além disso, o Ministério Público solicitou à Vigilância Sanitária a realização de novas coletas, cujos laudos, redigidos pela Univates, apontam que os lotes 028 e 272 (água mineral com gás de 1,5 litro, com validade até setembro de 2016) são impróprios para o consumo humano pelo mesmo motivo.
A Organização Mundial de Saúde estabelece que a água engarrafada para consumo humano deve ser totalmente livre de coliformes e Pseudomonas aeruginosa, devido à vulnerabilidade de crianças e idosos a esses microrganismos. A Pseudomonas aeruginosa é causadora de infecções respiratórias, urinárias e da corrente sanguínea em pessoas já com a saúde debilitada. Já a ingestão de coliformes provoca, em geral, graves distúrbios gastrointestinais.
INSPEÇÕES
Em julho do ano passado, uma inspeção da 16ª Coordenadoria Regional de Saúde (CRS) verificou os problemas em relação aos lotes 410 e 421. A empresa limitou-se em apenas informar que havia descartado o lote 410 e, diante disso, o servidor autuante sugeriu a multa de R$ 20 mil, que foi reduzida a R$ 12,5 mil pela primeira instância julgadora, e que, mediante recurso por parte do autuado, limitou-se a R$ 2 mil. Em janeiro deste ano, nova inspeção, realizada pela 16ª CRS e Centro Estadual de Vigilância em Saúde para verificação do cumprimento e eficácia das ações propostas na defesa ao auto de infração aplicado em julho, detectou fragilidades no controle de qualidade microbiológico da água mineral, bem como problemas graves de infraestrutura, o que levou o servidor autuante a sugerir a aplicação das penas de interdição e multa de R$ 5 mil. No entanto, a interdição foi transformada pelo Coordenador da 16ª CRS em apenas advertência.
Nas fiscalizações, foram encontradas bombonas que seriam descartadas misturadas a embalagens que seriam utilizadas, manipulação das tampas de bombonas sem cuidados higiênicos, bombonas vencidas e sujas utilizadas para reenvase, envase em dependências sem dispositivos à prova de roedores e que impeçam a entrada de pragas e de impurezas evitáveis, funcionários trabalhando com roupas impróprias e usando chinelos, sem aventais e em condições precárias de higiene, além de prateleiras enferrujadas, revestidas por papelão, em contato com rótulos e utensílios de limpeza. Não havia sabão e toalhas descartáveis para os funcionários, foram verificados canos abertos, buracos, trincas, área externa da indústria não pavimentada, com foco de poeira, terra, água estagnada, sem delimitação para o trânsito de veículos, entre outras coisas. Ainda, a licença sanitária, documento expedido pelo Município de Progresso, está vencida, assim como a Licença de Operação da Fepam (expirada em 2013).
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