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Painéis abordam panorama da violência contra a mulher no RS e no Brasil

Painéis abordam panorama da violência contra a mulher no RS e no Brasil

celio

Os números assustam. A cada quatro minutos, uma mulher é morta pela violência doméstica no Brasil. Esta é a principal causa da morte de mulheres entre 16 a 44 anos. Desses crimes, 99% são causados por ciúme e possessividade; 77% dos conflitos ocorrem depois da separação.

Em Porto Alegre, o número de ocorrências registradas de violência doméstica dobrou depois da Lei Maria da Penha. Hoje, a média é de mil registros na Delegacia de Polícia Especializada da Mulher por mês. Mas 60% das vítimas voltam aos companheiros, 20% não são localizadas e outras 20% solicitam o acompanhamento da Patrulha Maria da Penha, da Brigada Militar em conjunto com a Polícia Civil. Há 20 mil processos tramitando no Juizado de Violência Doméstica.

No Rio Grande do Sul, em 2012, morreram 93 mulheres vítimas de violência doméstica. Dessas, 15 tinham solicitado medida protetiva. São mais de duas mulheres mortas por semana no RS, 40% com idade entre 20 e 30, 70% dentro de casa, 55% à noite. Dos 90 autores, 40 foram presos, 29 estão em liberdade, 20 cometeram suicídio e um está foragido. Os municípios com maior índice são Porto Alegre, São Leopoldo e Alvorada. Das vítimas fatais, 40% haviam feito registro de ocorrência policial. O tempo entre o último registro e a morte varia entre 30 e 90 dias.

Esses dados foram transmitidos pelas duas palestrantes da manhã desta quinta-feira, 21, durante o Encontro Estadual do MP: Atualização em Estratégias de Combate à Violência de Gênero. A primeira a falar foi a Promotora de Justiça de Cuiabá (MT) Lindinalva Rodrigues Dalla Costa, membro da Comissão Permanente de Combate à Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (Copevid), que faz parte do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais (CNPG). Lindinalva Rodrigues contou que, mesmo com a aplicação com rigor da Lei Maria da Penha, “ouvimos ainda aquela frase arcaica de que ‘se ela não pode ser minha, não vai ser de mais ninguém’; temos todos o compromisso de combater as desigualdade que começam dentro de casa”.

Ainda segundo ela, o homem não começa matando. “Ele começa humilhando, agredindo, ameaçando; as mulheres ainda acham que não são completas se não tiverem um homem ao lado, porque nós ensinamos nossas filhas que elas precisam esperar o príncipe no cavalo branco, e muitas se perdem nesse processo. Devemos mudar esse pensamento”, enfatizou.

A segunda palestra da manhã foi da Coordenadora das Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher, Delegada Nadine Anflor. “Está na hora de dizermos que não basta apenas o processo criminal; precisamos do restante da rede de proteção, com casas abrigo, casas de passagem, assistência social e programas de reeducação dos agressores”, afirmou. “A mulher quer que o companheiro deixe de usar drogas, que deixe de ser machista, de ser agressivo, e isso é muito difícil. Cada mulher tem o seu tempo para romper a violência. Por mais frustrante que seja prender um agressor e saber que a vítima foi a primeira a visitá-lo no presídio, temos o dever de bem atender, que seja uma ou 20 vezes”, analisou a Delegada.

O mediador foi o Promotor de Justiça José Nilton Costa de Souza, que enfatizou a necessidade de discutir o assunto. Ele também parabenizou todas as pessoas envolvidas no combate a essa triste realidade. “A cultura equivocada da possessividade é o que deve ser combatido; temos de trabalhar na prevenção, na conciliação – quando possível – e falta também tratamento diferenciado na execução da pena por parte do agressor, com tratamento psicológico especializado, que hoje não se tem”, disse.

POR QUÊ ELAS NÃO VÃO EMBORA?

Durante a tarde, a primeira painelista foi Carmem de Campos, Mestre em Direito, que discutiu por quê as mulheres não saem das relações de violência. “Quando a mulher não deixa a relação violenta, como os órgãos públicos devem recepcioná-la para que ela denuncie as agressões?”, analisou a Doutoranda em Ciências Criminais pela PUCRS. Segundo ela, quando as mulheres procuram as autoridades, elas querem uma resposta pública do sistema de Justiça. “Isso representa que o processo criminal por si só é uma estratégia de inversão da relação de poder, um mecanismo importante para reequilibrar as relações de gênero”, disse. O painel foi coordenado pela Vice-Coordenadora da Copevid, Ivana Battaglin.

DESCONSTRUÇÃO DO MACHISMO

O painel organizado pelo Coordenador do Centro de Apoio Operacional Criminal, David Medina da Silva, trouxe o depoimento do Deputado Estadual Edegar Pretto, Coordenador da Frente Parlamentar de Homens Pelo Fim da Violência Contra as Mulheres, da Assembleia Legislativa. Ele falou da iniciativa no último Grenal de 2012, em que os atletas levantaram o cartão vermelho da campanha, vestidos todos com a mesma camiseta.

Em seguida, foi a vez do Professor de Filosofia e Sociologia da Faculdade Metropolitanas Unidas de São Paulo, Sérgio Barbosa. Ele é integrante do Coletivo Feminista Sexualidade e Saúde, organização não governamental que trilha um caminho alternativo para tentar cortar o ciclo da violência contra a mulher: o de reeducar os homens.

Conforme Sérgio Barbosa, o principal é discutir como se reproduz um pensamento patriarcal ancestral e quais ferramentas dele são usados nas relações interpessoais, no trabalho, em casa, como modelo estruturante do comportamento de mulheres e homens na sociedade. “Quanto mais cedo a mulher denunciar, mais fácil é o nosso trabalho; oferecemos vagas para o homem que xingou ou esbofeteou a mulher, pois queremos trabalhar na prevenção, na primeira crise, para desconstruir esses atributos de gênero aprendidos desde sempre”, argumentou.

O Coletivo trabalha com a desconstrução do ‘ser macho’, a ressignificação dos homens enquanto seres humanos. “A agressão não tem a ver com a bebida, com a droga, mas com a conduta íntima do agressor; a violência de gênero é um crime contra uma pessoa dentro de um processo de submissão”, discorreu.

David Medina encerrou o painel falando sobre a rede de proteção. “Esse não é um fardo só da Justiça, não é o Juiz, o Promotor ou o Delegado que vai resolver o problema se não houver centros de referência e estruturas públicas de acolhimento às vítimas”, concluiu.

SISTEMA DE JUSTIÇA CRIMINAL

O painel final da quinta-feira foi coordenado pelo Promotor de Justiça Especializada Criminal Ricardo Herbstrith e teve a palestra da Professora de Direito Luanna Tomaz, Conselheira da OAB do Pará. De acordo com a Jurista, a sociedade em geral tem o ideal de que bandido é o que rouba, que furta, e não quem agride a mulher em casa, e que há a “mulher honesta”, que se deita em apenas um leito, que cuida bem dos filhos e do marido.

Segundo a análise da Professora, para o operador do Direito, a boa vítima é a “mulher honesta”; má vítima é a que volta atrás depois da denúncia, e a mulher criminosa é a louca ou depravada. “O que muitas mulheres querem é que o homem passe em uma máquina e saia diferente, mas o que acontece é que ele vai sair da cadeia, vai casar de novo, vai bater na nova companheira e isso sempre se repetirá enquanto não tiver políticas voltadas para os agressores”, analisou. “Um garoto que aprende que o conflito se resolve quando o pai levanta a mão vai reproduzir o comportamento quando a mulher quiser sair com as amigas, mantendo o ciclo da violência”, finalizou.



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