GAECO/MPRS resgata documentos de origem pública do período da escravidão em Capão da Canoa e Porto Alegre
Release atualizado às 10h50
O Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado do Ministério Público do Rio Grande do Sul (GAECO/MPRS) cumpriu ordens judiciais nesta sexta-feira, 25 de abril, em Capão da Canoa, para resgatar documentos históricos e de origem pública do período da escravidão que deveriam estar sob a guarda do Poder Público. Os materiais estavam sendo divulgados nas redes sociais por dois investigados, dois irmãos conhecidos por vender livros raros pela internet. Ainda, durante a operação, apreenderam, em um sebo em Porto Alegre, outros três volumes de documentos públicos datados das décadas de 1860 e 1870.
Foram cumpridos dois mandados de busca e apreensão em endereços do município do Litoral Norte. Agentes do GAECO contaram com o apoio de quatro servidores do Arquivo Público do Estado e da Brigada Militar. Os documentos foram resgatados em um dos locais, e os técnicos do Arquivo Público do Estado, que participaram da operação, já comprovaram a veracidade dos registros. Após análise mais minuciosa, serão comprovadas as origens para definir a instituição arquivística de destino. Também foi autorizada a apreensão de outros arquivos e equipamentos eletrônicos.
A ação foi coordenada pelo promotor de Justiça Rogério Meirelles Caldas, do 10° Núcleo do GAECO/Sul. O caso também é apurado pela promotora de Justiça Camile Balzano de Mattos, da 1ª Promotoria Cível de Rio Grande.
ENTENDA O CASO
No dia 14 de abril deste ano, dois irmãos investigados, que atuam no ramo de livros raros, inclusive com vendas e divulgação destes materiais nas redes, em site e em canal do YouTube, postaram no Instagram que estavam com dois documentos históricos – resgatados de um incêndio em cartório, segundo eles – que mostravam parte do regime escravocrata brasileiro da antiga província de Rio Grande. Dois dias depois, uma equipe técnica do Arquivo Público do Rio Grande do Sul identificou os materiais como de possível origem pública.
A equipe acionou a Secretaria de Planejamento, Governança e Gestão do Estado. O órgão, por meio de um ofício, entrou em contato com o MPRS, em Rio Grande, e a promotora Camile de Mattos, junto com integrantes do governo, realizou uma análise que verificou grandes indícios de que os documentos são verdadeiros e que estavam na posse dos investigados. Diante da possibilidade de que eles poderiam vender os registros com possível origem pública, a promotora acionou o 10° Núcleo do GAECO/Sul e, junto com o promotor Rogério Caldas, obteve na Justiça dois mandados de busca e apreensão em residências dos investigados, em Capão da Canoa. Conforme investigação, um dos irmãos estava oferecendo os documentos por R$ 10 mil.
DOCUMENTOS
São dois documentos de origem pública produzidos por órgãos do governo imperial em Rio Grande, na época em que ainda era uma província. Os registros seriam do século 19, com fatos datados entre os anos de 1857 e 1859. Um deles detalha óbitos de escravizados, e o outro, penas e castigos para punir o que o sistema da época entendia como crimes cometidos por estas pessoas escravizadas citadas. De acordo com análise preliminar do GAECO, um dos documentos foi furtado do museu de Arroio Grande em 2012 e outro furtado do cartório de Rio Grande. Estes fatos serão apurados pelo GAECO, assim como a origem de outros dois documentos que estavam com o investigado e foram vendidos para compradores em Minas Gerais.
No sebo da Capital, houve o resgate de um documento de registro de emancipação de escravizados e dois de registros de exportações do porto de Rio Grande, da mesma época.
CRIMES
Os crimes apurados até o momento constam no artigo 305 do Código Penal, que é destruição, supressão ou ocultação de documentos públicos ou particulares; bem como, o artigo 62 da Lei de Crimes Ambientais (Lei 9.605/1998), que é destruir, inutilizar ou deteriorar bens protegidos por lei, ato administrativo ou decisão judicial; com violação da Lei 8.159/1991, que dispõe sobre a política nacional de arquivos públicos e privados. O GAECO segue apurando para verificar se há outros delitos neste caso investigado.
RISCOS
Além do risco de venda dos documentos, a medida judicial foi tomada em função de, no vídeo divulgado nas redes sociais, o investigado ter manuseado o material sem o uso de luvas, sendo que o contato direto com a pele pode transferir óleos e sujeiras para o papel, acelerando seu desgaste e deterioração. Outro fato é que não há informações sobre as condições de armazenamento dos registros, o que levanta preocupações sobre sua exposição a fatores prejudiciais como umidade, luz solar direta e variações de temperatura.
MEDIDAS
A primeira medida foi o resgate dos documentos sobre escravos, por meio de mandado judicial de busca e apreensão, e a segunda será o encaminhamento ao Arquivo Público do Estado para confirmar a origem pública e também o estado de conservação dos materiais. Eles necessitam de avaliação adequada que determine as medidas necessárias para conservação e restauração.
Outras ações são garantir a integridade e a ampla divulgação dos documentos, possibilitando que continuem servindo como fonte de conhecimento histórico. Até porque é dever do Poder Público zelar pela guarda de documentos deste tipo, conforme a Lei Federal 8.159/1991. Cabe também ao GAECO verificar como os investigados obtiveram os documentos, por exemplo, se houve furto, desvio, entre outros.
Fotos: Grégori Bertó | MPRS