Operação Hipocondríacos: GAECO/MPRS investiga esquema criminoso que fraudava laudos médicos para líderes de facção receberem prisão humanitária
O Ministério Público do Rio Grande do Sul (MPRS), por meio do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO) – Núcleo Capital – e da 8ª Promotoria de Justiça Especializada Criminal de Porto Alegre, realiza nesta terça-feira, dia 25 de fevereiro, na Região Metropolitana, a “Operação Hipocondríacos”. O objetivo é coibir fraudes envolvendo atestados e laudos médicos utilizados em processos para induzir magistrados ao erro na concessão do benefício da prisão domiciliar humanitária a apenados de alta periculosidade e líderes de facção criminosa. Os crimes apurados são de falsidade ideológica, uso de documentos falsos, organização criminosa e lavagem de dinheiro.
A investigação iniciou a partir da constatação de um padrão de atuação criminosa para obtenção de prisões domiciliares humanitárias e outros benefícios extraordinários a líderes de facções criminosas durante a execução de longas penas privativas de liberdade ou em ações penais em que se encontravam presos preventivamente. Um integrante do grupo criminoso, que atua como intermediário, profissionais de saúde, entre eles, um médico traumatologista, e ainda advogados são investigados por falsificar o conteúdo de documentos para presos preventivos e apenados com vários anos de condenação, sem possibilidade de progressão de regime.
ESQUEMA CRIMINOSO
O esquema fraudulento consiste em informar a realização de cirurgias ou tratamentos médicos desnecessários e, ainda, com longos períodos de recuperação, de até um ano, entre outros cuidados pós-operatórios que não precisavam ser realizados. Em todos os casos investigados pelo promotor de Justiça Flávio Duarte, coordenador do Núcleo Capital do GAECO/MPRS, a forma de atuação do grupo criminoso foi a mesma, sempre envolvendo a alegação de que estariam ocorrendo problemas leves ou inexistentes de coluna que eram atestados em laudos como graves e com a necessidade de um pós-operatório complexo.
O teor dos documentos elaborados pelo médico, de agendamentos fictícios de procedimentos a laudos de cirurgias, era determinado por uma advogada e por um intermediário da facção, para posterior utilização, inclusive por outros procuradores, nos processos que envolviam os líderes da organização criminosa. Em alguns casos, a advogada ressaltava, por exemplo, que o laudo estava “fraco” e solicitava que o médico “dramatizasse mais” o teor dos documentos para convencer juízes a conceder os benefícios para os líderes da facção.
FINANCIAMENTO E FUGAS
Os presos fugiam ou cometiam novos delitos logo após serem beneficiados com a prisão domiciliar humanitária nas condições fraudulentas. A investigação também apurou a forma como todo o esquema criminoso era financiado. Sempre por meio de empresas administradas pela própria facção, algumas delas dos ramos da construção civil e de consultoria de recursos humanos, em nome de terceiros, utilizando os valores obtidos com as práticas delituosas que cometiam para arcar com as despesas e os honorários médicos dos respectivos líderes da organização criminosa.
FRENTES DE ATUAÇÃO
A promotora de Justiça Alessandra Moura Bastian da Cunha, coordenadora do Centro de Apoio Operacional Criminal (CAOCRIM) e do Núcleo de Assessoramento em Execução Penal (NAEP) do MPRS, diz que o Núcleo detectou esta situação em 2024 e por isso foram traçadas três frentes de atuação: "a primeira investigativa através do GAECO para responsabilizar os integrantes do esquema criminoso. No segundo eixo, o MPRS fomentou a articulação de um protocolo de atendimento de saúde dentro do sistema prisional, juntamente com a Polícia Penal e com o Poder Judiciário, visando dar maior segurança no momento da avaliação dessas concessões. Por fim, o MPRS ainda participa do Programa de Dissuasão Focada, implementado pelo Estado, para, dentre outras medidas, ser realizado o incremento do atendimento médico dentro do sistema prisional, evitando que seja necessário o atendimento em liberdade”.
Também participaram da Operação Hipocondríacos os promotores de Justiça André Dal Molin, coordenador estadual do GAECO, e Maristela Schneider, coordenadora do GAECO – Região Metropolitana. A ação teve o apoio da Brigada Militar. A investigação do MPRS continua.
PRISÃO DOMICILIAR HUMANITÁRIA: forma de pena alternativa que permite que condenados cumpram suas sentenças em casa, em vez de na prisão. Isso acontece em situações especiais, quando há motivos humanitários fortes para justificar essa medida. A decisão de conceder o benefício é tomada por um juiz, que avalia cada caso individualmente.
Fotos: Grégori Bertó | MPRS