Caso Kiss: Promotoria de Justiça apresenta promoção de arquivamento de inquérito civil
Nesta terça-feira, 8, a Promotoria de Justiça Cível de Santa Maria encaminhou ao Conselho Superior do Ministério Público a promoção de arquivamento do inquérito civil instaurado para investigar expedição de alvarás municipais à boate Kiss. As investigações concluíram que, apesar das falhas administrativas apontadas (como a falta de comunicação entre o setor de cadastro imobiliário, que expediu alvará de localização e o renovou por duas vezes, e a Superintendência de Análise de Projetos e Vistorias, que não autorizou realização de reforma predial no local), não é o caso de responsabilização por improbidade dos agentes públicos municipais. Essas falhas já foram motivadoras da expedição de Recomendações pelo MP para alterações legislativas e normativas dos processos de fiscalização e regularização de imóveis nos últimos anos.
A promoção de arquivamento é assinada pela Promotora de Justiça Jocelaine Dutra Pains. As condutas dos agentes públicos foram observadas a partir dos preceitos da Lei Federal nº 8.429/92 (Lei da Improbidade Administrativa), bem como da Lei Municipal nº 3.301/1991, das Leis Complementares Municipais nº 092/2012, nº 070/2009 (Código de Obras do Município de Santa Maria), das Leis Municipais nº 4040/1996 e nº 4041/1996, do Decreto Municipal nº 32/2006 e da Lei Estadual nº 10987/1997.
LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
O inquérito iniciou seu trâmite três dias após a tragédia, em 30 de janeiro de 2013.
Conforme o investigado, não foi possível identificar que qualquer conduta tenha sido voltada à obtenção de vantagem patrimonial por qualquer um dos agentes públicos envolvidos nas concessões de licenças, condição imprescindível para o enquadramento nas sanções previstas no art. 9º pela Lei de Improbidade Administrativa, tampouco restando identificada ocorrência de violação deliberada dos princípios da administração pública (art. 11 da Lei). As circunstâncias não revelam a presença de dolo, nem mesmo o genérico, nos termos em que vem decidindo o Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Foi também examinada a possibilidade de eventual ocorrência de improbidade causadora de prejuízo ao erário, isto porque a Lei de Improbidade prevê, no art. 10, que os atos que proporcionem danos aos cofres públicos podem ser punidos como atos de improbidade administrativa, desde que comprovada a relação do ato ou omissão com o resultado lesivo, e também condicionada à existência de dolo ou, no mínimo culpa grave, dos agentes públicos. Ao final da investigação, concluiu-se não haver nexo causal entre o que originou o dano (fogo) e as eventuais falhas administrativas ocorridas em razão das lacunas legislativas existentes à época no Município.
Assim, não se vislumbrou possibilidade de responsabilização, por improbidade administrativa, do Secretário Municipal de Controle e Mobilidade Urbana, Miguel Caetano Passini, do fiscal e Superintendente de Fiscalização da Secretaria Municipal de Controle e Mobilidade Urbana, Beloyannes Orengo de Pietro Júnior, do Secretário de Município de Proteção Ambiental, Luiz Alberto Carvalho Júnior, e do Chefe da Equipe de Cadastro Mobiliário e Imobiliário do Município, Marcus Vinícius Bittencourt Biermann.
LEGISLAÇÃO MUNICIPAL
As investigações apontaram que todos os documentos necessários para a expedição do alvará de localização, em abril de 2010, estiveram presentes. Apesar de o alvará sanitário, necessário à concessão do alvará de localização, ter sido expedido em 19/01/2010, ele era materialmente válido, pois sua validade era anual, tendo ocorrido apenas equívoco formal na inscrição da data no documento. Nos anos subsequentes, houve vistorias regulares e o documento estava em vigência quando ocorreu a tragédia. Da mesma maneira, a Licença de Operação, o Estudo de Impacto de Vizinhança, o Laudo de Isolamento Acústico estavam vigentes. O Alvará de Proteção Contra Incêndio estava expirado desde agosto de 2012 e em vias de renovação, com taxas já pagas pelo proprietário da casa noturna e aguardando vistoria. Os Bombeiros, no entanto, não comunicaram ao município que o documento estava fora da validade porque, conforme investigação do MP, entenderam que essa situação não impedia a manutenção da casa em funcionamento.
PPCI
Ainda segundo a promoção de arquivamento, a situação envolvendo o alvará em PPCI, de exclusiva atribuição do Corpo de Bombeiros, é alvo de ação civil pública ajuizada pelo MP contra os Bombeiros Alex da Rocha Camilo, Altair de Freitas Cunha, Daniel da Silva Adriano e Moiséis da Silva Fuchs e tramita na 4ª Vara Cível de Santa Maria. Os réus são acusados de utilizarem apenas um programa de computador para o processamento de licenciamentos em detrimento dos demais procedimentos previstos em lei para tal finalidade.
PREFEITO
Segundo a promoção de arquivamento, a edição e coexistência de diplomas legais que aparentemente não se integravam (ao menos não com a desejável e necessária clareza), não podem ser atribuídas ao Prefeito de Santa Maria, César Schirmer, e não constituiriam por si mesmas condutas configuradoras de improbidade administrativa. O Decreto Executivo Municipal nº 32/2006, que regrava à época a expedição do alvará de localização (tal como feito no caso da boate Kiss), é de gestão administrativa anterior ao primeiro mandato do atual chefe do Poder Executivo (que começou a governar a cidade em 2009). O Código de Obras do Município de Santa Maria, embora seja lei complementar municipal editada em 2009, manteve as normas sobre os sistemas de segurança, prevenção e combate a incêndio do Código de 2005.
“A organização da administração pública é feita de forma piramidal, de modo que aqueles que estão na base da pirâmide têm como principais atribuições a execução de tarefas, enquanto que aqueles que estão no ápice têm como função a elaboração de planos, visando ao alcance do fim público. Descabido, por razões óbvias, pretender que o Prefeito de Santa Maria, cidade com mais de 260 mil habitantes, tenha, pessoalmente, o controle dos alvarás expedidos pelas secretarias municipais”, frisa o documento.
É importante salientar que a conduta dos servidores mencionados já foi alvo de arquivamento criminal homologado pelo Judiciário em Santa Maria. A conduta do Prefeito no âmbito criminal também foi objeto de arquivamento encaminhado pela Procuradoria-Geral de Justiça e homologado pelo Tribunal de Justiça.
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