São Gabriel: recurso contra decisão que rejeitou qualificadora na denúncia
O Ministério Público ingressou na Justiça de São Gabriel com uma apelação contra a decisão que rejeitou a qualificadora do recurso que dificultou a defesa da vítima, na denúncia oferecida contra o soldado Alexandre Curto dos Santos, 38, responsável pelo disparo de espingarda calibre 12 que matou o colono Elton Brum da Silva, 44. O fato ocorreu durante ação de reintegração de posse executada em 21 de agosto deste ano pela BM em propriedade rural que havia sido ocupada por integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra - MST.
O MP denunciou o militar por homicídio qualificado no dia 6 do mês passado, entendendo que ele não seguiu recomendação do comando da operação para que não fosse utilizada munição letal e, ainda, alvejou o sem-terra pelas costas. Entretanto, a Justiça aceitou parcialmente a denúncia, não reconhecendo a qualificadora. Nesta sexta-feira, o promotor de Justiça Leonardo Giardin de Souza interpôs o recurso que, após receber a manifestação da defesa, deverá ser encaminhado ao Tribunal de Justiça do Estado para apreciação.
RECURSO
O Promotor de Justiça de Rosário do Sul, que estava substituindo em São Gabriel, pondera que não há “previsão legal” para o inusitado “recebimento parcial” da denúncia. Ele alega que neste momento processual o Magistrado deve proferir “mero juízo delibatório”, a fim de impulsionar o processo, caso a denúncia seja apta. Diz, também, que a decisão cerceia à acusação o direito de “robustecer, em juízo, a prova indiciária”.
Leonardo Giardin enfatiza que descabe a análise aprofundada da prova obrada na decisão, “ainda com mais razão por se tratar a hipótese de crime da competência do Tribunal do Júri, em que cabe à sociedade, representada pelos jurados, decidir acerca dos fatos, e não ao juiz togado”. O MP entende que o momento processual oportuno para a admissão ou não da qualificadora é o da sentença de pronúncia. “Fulminar de plano parte da pretensão punitiva estatal, retirando o caráter hediondo do fato denunciado por meio da exclusão prematura da qualificadora é evidente açodamento e em desfavor da sociedade”, frisa o Promotor.
Giardin sustenta que não se pode descartar que a vítima tenha sido surpreendida pelo disparo, desferido pelas costas. Além disso, a narrativa da denúncia, no sentido de que o sem-terra encontrava-se alheio ao confronto no momento do disparo, é confortada pelas imagens realizadas pela própria Brigada Militar, em que é possível visualizar a vítima caminhando, com as mãos nos bolsos. As imagens também dão conta de que, quando do disparo, não havia qualquer ato agressivo por parte da resistência do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra.
O integrante do Ministério Público argumenta, ainda, que não se pode afirmar que a vítima tinha conhecimento acerca da utilização de munição letal pela BM que, até então, vinha desferindo disparos com munição anti-motim. Portanto, se era praxe a utilização apenas de munição anti-motim em operações da mesma natureza, e isso era conhecido dos integrantes do MST, “mais do que plausível, é certo que o uso de munição letal causou surpresa à vítima, merecendo ser admitida a acusação tal posta na denúncia”, conclui Leonardo Giardin de Souza.