Ações de pedófilos são expostas em jornada no Vale do Sinos
“As organizações que exploram a pedofilia são gerenciadas por pessoas normais que fazem do crime um comércio”. A revelação é do professor de Direito da Feevale, Ricardo Breier. Ele foi palestrante na III Jornada Estadual contra a Violência e a Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes que, nesta segunda-feira, 29, cumpriu mais dois compromissos da programação que busca esclarecer e estimular a sociedade rio-grandense a combater o abuso de crianças e adolescentes no Estado. Desta vez, as comunidades de Novo Hamburgo e São Leopoldo é que tiveram a oportunidade de receber os promotores da III Jornada. Com os eventos realizados nas cidades da região do Vale do Sinos, foi concluída uma série de sete encontros. A organização é da Assembléia Legislativa, Fundação Maurício Sirotsky Sobrinho e Ministério Público do Rio Grande do Sul.
Na próxima sexta-feira, 2 de setembro, a Jornada seguirá com os trabalhos em Santo Ângelo e Cruz Alta. As audiências públicas de Novo Hamburgo e São Leopoldo – apontada como uma das cidades pólos da violência sexual no Estado pelo Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente – tiveram a participação de conselheiros tutelares, assistentes sociais, psicólogos e outros profissionais inerentes à área da infância e juventude. Também foram prestigiadas por autoridades municipais, pela coordenadora do Movimento pelo Fim da Violência e Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes do Rio Grande do Sul, Mariza Alberton, e pelo coordenador do Gabinete de Articulação e Responsabilidade Social do Ministério Público, João Carlos Pacheco.
PEDOFILIA
No plenário lotado da Câmara de Vereadores de Novo Hamburgo, o público ouviu atentamente o professor Ricardo Breier discorrer sobre a pedofilia individual, que tem uma forma específica de abusar de crianças para “fazer valer um desejo sexual”. Por trás dessa realidade se encontram meninos e meninas de até 12 anos, angariados pelas redes de pedófilos que “estão em todo o lugar, se proliferam e possuem um alcance imaginável com o auxílio da Internet”. Breier ressaltou que a organização criminosa que atua no comércio da pedofilia “possui hierarquia, seleciona a vítima, seqüestra, leva para o local da rede e, depois de doutrinada e manipulada, entrega para pedófilos que a exploram”. O professor disse que somente nos Estados Unidos, “são ganhos mais de 5 milhões de dólares com imagens e materiais pornográficos através da rede mundial de computadores”. São mais de 17 mil sites espalhados pelo mundo e, muitas vezes, “a criança usada no crime que virou comércio internacional, aparece vítima de homicídio”.
ABUSOS
O deputado Fabiano Pereira, que presidiu as audiências, assinalou que “80% dos abusos são provenientes de relações intrafamiliares”. Jeferson Weber dos Santos, representante da Fundação Maurício Sirotsky Sobrinho, sustentou que as campanhas somente terão sucesso “se houver um trabalho forte na rede de proteção à criança”. O coordenador do Centro de Apoio Operacional da Infância e da Juventude, Miguel Granato Velasquez, aproveitou para falar da questão envolvendo o adolescente infrator, tema muito explorado pela mídia. Velasquez foi categórico em esclarecer que “não mais de 10% dos crimes são cometidos por adolescentes e decorrentes da fome e da miséria”. Explicou que a maioria das crianças são vítimas da violência da sociedade ou daqueles que deveriam defendê-las.
OCORRÊNCIAS
Miguel Velasquez informou que 27 ocorrências de maus tratos contra crianças e adolescentes são feitas por dia no Estado. No ano passado, foram registradas, aproximadamente, 10 mil. “Dessas, seis mil e quinhentas são de lesões corporais e quase mil envolvem estupro”, sublinhou o Promotor de Justiça, frisando que “a sociedade é violenta porque há violência contra as crianças e, para essa covardia, deve haver um basta”. Velasquez pregou uma interferência de todos na causa, porque “cada ação nossa é uma criança que está sendo protegida”. Insistiu que deve haver uma mudança de cultura em torno de um trabalho mais efetivo de proteção para não haver violação aos direitos da criança. “Violência não se resolve com violência, mas com inteligência”. Por isso, convocou a todos para estarem atentos e iniciarem uma marcha de conscientização com propósito de unir esforços na defesa da criança e do adolescente. Velasquez observou que o local mais perigoso é a própria casa da criança. “Há grande preocupação com as ruas e pouca com os lares. Uma criança não tem voz para se defender!”, concluiu.
DEPOIMENTO
Nas audiências foi exibido o CD que apresenta o “Depoimento sem dano”, trabalho inspirado no estudo da promotora de Justiça Veleda Dobke. O objetivo do depoimento é proteger a criança vítima de violência e ouvi-la para colher aquela que, muitas vezes, segundo Veleda, “é a única prova no processo quando o delito não deixa vestígios”. A médica Joelza Mesquita Andrade Pires, do Serviço de Proteção à Criança da Ulbra, enfatizou a importância da “articulação da rede de proteção” e que o abusador, além de ser responsabilizado, “também tem direito a tratamento”. Abordando as realidades locais, ainda se manifestaram os Promotores de Justiça que atuam na área da infância em Novo Hamburgo e São Leopoldo. Manoel Luiz Prates Guimarães destacou a luta travada pela Promotoria para que “o dano psicológico seja prova do crime” e, apesar do bom serviço na rede de atendimento, “há falta de técnicos para trabalhar”. Sua colega Mara Cristiane Job Beck Pedro, de São Leopoldo, narrou no auditório da antiga sede da Unisinos as campanhas e blitz realizadas na cidade para coibir a prostituição. O problema está centralizado no bairro Rio dos Sinos, “onde jovens da região saem nas ruas para vender o corpo”.
(Jorn. Marco Aurélio Nunes).